💌 Carta Aberta: Mãe, eu sou uma mulher trans

Querida mãe,

e também querida leitora,

ou leitor, ou amiga, ou irmã…

Essa carta é pra você. Pra quem já precisou esconder quem é. Pra quem ainda está escondendo. E, principalmente, pra você, mãe, que agora sabe da minha verdade.

Contar pra você que eu sou uma mulher trans foi um dos momentos mais difíceis… e mais libertadores da minha vida. E mesmo que eu ainda esteja tentando entender tudo isso dentro de mim, mesmo sem ter todas as respostas, eu sabia que essa conversa precisava acontecer. Era inevitável. Era sobre existir.

Por muito tempo, eu guardei essa parte de mim como se fosse um segredo perigoso. Me escondi atrás de roupas, de nomes, de sorrisos treinados…Vesti o papel de um filho que todos esperavam. Até eu. E cansei. Cansei de me trair.

Naquela sexta-feira, eu não dormi. O coração tava acelerado, a cabeça girando, as mãos suando. Eu sabia que era o dia. Tava nervosa, com medo, mas com um desejo imenso de me libertar. De poder ser… eu.

E sabe o que me deu força?

A Beca.

Minha esposa, minha parceira, minha luz.

Ela segurou minha mão e me lembrou que viver pela metade não é viver.

Ela me disse que eu merecia ser vista no mundo como realmente sou.

E aí, mãe… eu contei.

Te olhei nos olhos e disse.

Falei com voz trêmula, com palavras inseguras, mas com o coração mais aberto do que nunca.

Você me ouviu.

Você tentou entender.

Mesmo sem saber exatamente como reagir, você ficou.

E isso… isso vale mais do que tudo.

Você me acolheu do seu jeitinho…

Com aquele amor de mãe que se mistura com preocupação, com dúvida, com aquele medo do que vem pela frente.

Você ainda me chamou de filho… e eu entendo.

Sei que isso tudo é novo, e que a transição não é só minha.

Ela é nossa.

A gente vai caminhar juntas por esse novo caminho.

Mostrei fotos, vídeos, falei da infância, da minha vida com a Beca, da minha história vivida em segredo…

E você me ouviu.

Você me acolheu.

Talvez não tenha compreendido tudo, mas você ficou.

E isso, mãe… isso é amor.

Ainda não contei pro pai.

Não sei quando vou conseguir.

Se vai ser comigo, se vai ser com você…

Mas tudo bem. Uma coisa de cada vez.

Por enquanto, só saber que você sabe… que você me abraçou… já é uma vitória imensa.

É um muro a menos.

É um respiro.

Mãe, essa carta também é pra te dizer…

Você não tem culpa de nada.

Eu me escondi porque achei que precisava.

Porque o mundo foi cruel.

Porque eu precisei me proteger.

Mas o seu amor… ele sempre esteve aqui.

Obrigada por não me fazer sentir sozinha.

Obrigada por me ouvir.

Obrigada por me ver, mesmo sem ver tudo ainda.

Obrigada por continuar aqui.

E me desculpa…Pelo tempo que levei pra me entender.

Pelo tempo que levei pra te contar.

Pela dor que eu sei que tudo isso traz.

Mas também, obrigada.

Por me amar mesmo assim.

Por ser você.

Pra você que está lendo essa carta agora…

Se você ainda não teve essa conversa… eu te entendo.

E eu quero que você saiba:

Você não está sozinha.

Tem mais de nós aqui.

Tem mães que aprendem a amar de novo.

Tem parceiras que seguram nossa mão.

Tem amigas que escutam.

E tem você. Com sua força, com sua verdade, com seu brilho.

Essa carta é só um pedaço da minha história…

Mas também é uma promessa:

Eu não vou mais me esconder.

E, se eu puder, quero ser uma daquelas vozes suaves que sussurram no seu ouvido, nos dias de medo:

“Você é válida. Você é amada. E você pode, sim, viver como você é.”

Com amor, com verdade,

e com todo o brilho que existe em mim,

Paula Lavigne Silva https://www.paulalavigne.com.br

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